Nova Iorque (Dos enviados especiais) – O líder da junta que governa a Guiné-Conakry, coronel Mamadi Doumbouya, convidou a comunidade internacional a parar de condenar os golpes de Estado, em África, para se interessar mais pelas causas deste fenómeno ressurgido recentemente sobretudo nos países francófonos.
Na sua intervenção quinta-feira, em Nova Iorque, no debate geral da 78.ª sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas, Doumbouya considerou tratar-se de uma questão de “honestidade e correcção”.
Segundo ele, a comunidade internacional “deve ter a honestidade e a correção” de não se contentar apenas com a denúncia das consequências dos golpes de Estado, mas interessar-se pelas causas do problema, para encontrar soluções.
Mamadi Doumbouya entende que se os golpes de Estado se multiplicaram, nos últimos tempos, em África, “é porque há razões muito profundas”, uma vez que, argumentou, golpista “não é apenas aquele que pega em armas para derrubar um regime”.
Pelo contrário, prosseguiu, os verdadeiros golpistas e os mais numerosos, “que não são objecto de qualquer condenação, são aqueles que maquinam, que usam o engano, que manipulam os textos das Constituições, a fim de manter-se eternamente no poder”.
“São os trabalhadores de colarinho branco que mudam as regras do jogo durante o jogo para manter as rédeas do país. Estes são os golpistas mais numerosos”, rematou.
Justificou a acção militar por ele liderada para destituir o Presidente Alpha Condé, a 5 de Setembro de 2021, como uma tomada de consciência das responsabilidades da sua equipa nos esforços para evitar que o país caísse no “caos completo”.
Na altura da insurreição, disse, as forças políticas do país estavam todas completamente neutralizadas e ninguém tinha a coragem nem os meios “para pôr fim à impostura” que a sociedade guineense enfrentava.
Por isso, disse tratar-se de uma “rectificação institucional” necessária num contexto de quebra do tecido social e de uma convivência minada.
Para Mamadi Doumbouya, os cenários de tomada de poder pelas forças de defesa e segurança estão associados à própria “evolução” das sociedades africanas, especialmente na África Ocidental, mas que têm suscitado questionamentos, reflexões e acções variadas da comunidade internacional.
“A pergunta que devemos colocar-nos diante desta situação é a seguinte: Porquê transições militares agora?”, questionou antes de admitir não ter “todas as respostas” mas alguns “elementos de resposta” baseados na experiência do seu país e de outros da região confrontados com as mesmas realidades.
Insistiu que as transições em curso, em África, devem-se a vários factores com destaque para o amadurecimento da população perante promessas eleitorais não cumpridas e alterações constitucionais ilícitas por aqueles que pretendem perpetuar-se no poder em detrimento do bem-colectivo.
Na sua óptica, os povos africanos estão hoje mais acordados do que nunca e determinados a levar os seus destinos em mãos, agastados com longos anos de má distribuição da riqueza que cria desigualdades sem fim, acompanhadas da fome e da pobreza extrema que tornam o dia-a-dia das populações cada vez mais difícil.
“Quando as riquezas de um país estão nas mãos de uma elite, enquanto os recém-nascidos morrem nos hospitais devido à falta de incubadoras, não é surpreendente que em tais condições testemunhemos transições para atender às aspirações profundas do povo”, reforçou.IZ