Abidjan - O antigo líder dos Jovens Patriotas da Côte d'Ivoire, Charles Blé Goudé, abordou hoje o seu regresso ao país com o ex-presidente Laurent Gbagbo, que recuperou o passaporte e deverá viajar em Dezembro.
Tal como o antigo presidente ivoiriense, Blé Goudé, 48 anos, foi absolvido de crimes contra a humanidade em primeira instância pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) e aguarda, em Haia, um possível recurso em liberdade condicional.
"O Presidente Gbagbo quis dar-me pessoalmente as informações (da entrega do seu passaporte) e assumiu a responsabilidade de abrir o caminho para o nosso regresso à pátria", escreveu Charles Blé Goudé numa declaração.
"Uma porta para Abidjan está a abrir-se para nós", acrescentou.
"O seu regresso [de Gbagbo] à terra natal poderia contribuir grandemente para o apaziguamento da situação sociopolítica", considerou, saudando o "acto republicano e fraterno das autoridades da Côte d'Ivoire.
Laurent Gbagbo anunciou na sexta-feira, através do seu advogado, que tinha obtido dois passaportes, um comum e um diplomático, e que espera regressar ao país em Dezembro.
Blé Goudé tinha fugido da Costa do Marfim após a crise pós-eleitoral de 2010-11, que matou 3 mil pessoas e terminou com a vitória do Presidente eleito Alassane Ouattara e a detenção de Laurent Gbagbo.
Foi detido em 2013 no Ghana e transferido para o TPI em 2014 para ser julgado ao lado de Laurent Gbagbo.
Os dois foram absolvidos, em primeira instância, em Janeiro de 2019.
Charles Blé Goudé foi um dos membros mais controversos do clã Gbagbo, sendo apelidado de "General das Ruas" pela sua capacidade de mobilizar apoiantes do antigo presidente da Côte d'Ivoire.
Os seus críticos e ONG internacionais consideram-no um dos que mais contribuíram para a violência durante a crise pós-eleitoral de 2010-11.
Laurent Gbagbo, 75 anos, que está em Bruxelas, saudou a emissão do passaporte como "um acto no sentido do apaziguamento" e apelou às autoridades ivoirienses "para darem mais um passo no sentido do relaxamento do clima sociopolítico", ainda tenso um mês após as eleições presidenciais que reelegeram Alassane Ouattara para um controverso terceiro mandato.
A votação ficou marcada por um boicote da oposição e por violência em várias cidades do país, da qual terão resultado pelo menos 85 mortos e quase 500 feridos, segundo diversas estimativas.
O processo de atribuição do passaporte ao antigo presidente arrastava-se há meses, com os seus apoiantes a acusarem as autoridades marfinenses de se recusarem a conceder-lhe o documento para que não pudesse regressar ao país para as eleições presidenciais de 31 de Outubro.
A candidatura presidencial de Laurent Gbagbo chegou a ser apresentada na Côte d'Ivoire pelos seus apoiantes, mas foi invalidada pelo Conselho Constitucional.
O regresso do Gbagbo é um dos pontos de discórdia entre o Governo e parte da oposição, que não reconhece a reeleição de Ouattara.
O actual chefe de Estado declarou repetidamente que era favorável a um regresso do Gbagbo ao país.
Fontes presidenciais, citadas pela agência France Presse, adiantaram que foi visto com agrado que o ex-presidente não tenha acompanhado o apelo da oposição à "desobediência civil" e que se tenha manifestado contra a participação dos quadros do seu partido no "Conselho Nacional de Transição" proclamado pelos opositores para substituir o Governo de Ouattara.
A agitação pós-eleitoral levou à detenção de várias figuras políticas, incluindo o porta-voz da oposição e o antigo primeiro-ministro Pascal Affi N'Guessan, e Maurice Guikahué, número dois do principal partido da oposição.
Laurent Gbagbo enfrenta ainda uma pena de prisão de 20 anos na justiça da Côte d'Ivoire num processo relacionado com desvio de fundos do Banco Central dos Estados da África Ocidental durante a crise de 2010-2011.